Recentemente, durante uma entrevista sobre o lançamento do novo álbum do Foo Fighters, o vocalista Dave Grohl afirmou que o novo álbum do grupo, Sonic Highways, seria uma síntese da música americana. Para isso viajaria por vários estúdios emblemáticos dos Estados Unidos afim de captar essa essência e realizar um álbum que se tornasse fundamental na história da banda.
Independente do resultado final, Dave Grohl levantou uma questão interessante sobre a música americana. Afinal, estamos diante do maior mercado consumidor do mundo e é interessante nos perguntarmos quais os ritmos definiram a música da Terra do Tio Sam ao longo do último século.
Mesmo que seja impossível responder essa questão com precisão, fica nítido que algumas regiões abraçaram com maior intensidade certas vertentes musicais. Basta ter em vista o cast de artistas de gravadoras como a Stax Records, do Tennessee, e a Motown, em Memphis, assim como os grandes selos localizados em Nova York.
Ainda assim, esse é um assunto que deve ser visto com maior profundidade e alheio ao aspecto comercial. E esse olhar revela – por exemplo – a influência do jazz e do blues na música feita no estado da Louisiana, assim como o country e o folk no Tennessee.
Tendo isso mente, começamos a perceber de forma mais clara artistas que conseguiram captar com maior amplidão toda atmosfera musical construída ao seu redor permanecendo alheio ao mercado pop tão expressivo no país. Um bom exemplo é a vocalista e guitarrista Ruthie Foster, que lançou em 2014 seu sétimo álbum de estúdio, Promise of a Brand New Day.
Desconhecida do grande público, a cantora texana talvez seja um dos poucos nomes que conseguiram ao longo das últimas décadas reunir a nata da música americana em uma carreira que permanece alheia ao mainstream e à influência da música pop.
Com uma facilidade ímpar em catalisar elementos da música country, do blues, folk e até mesmo do gospel americano, Ruthie Foster vive uma realidade diferente da geração atual de músicos.
Apaixonada por música desde os 12 anos, a talentosa artista caminhou na contramão do mundo da música ao negar um contrato com a Atlantic Records para se aprofundar nas raízes da música americana. Durante essa época, Ruthie servia a Marinha e se apresentava em bares de Nova York, o que rapidamente chamou a atenção da gravadora.
A enfermidade da mãe durante a década de 90 afastou a cantora de Nova York e a fez retornar para a pequena cidade de Brazos County, no Texas, onde passou a trabalhar como auxiliar em uma pequena estação de TV. Sem abandonar a música, lançou seu primeiro álbum após a morte da mãe, em 1996, assinando com uma pequena gravadora especializada em artistas dedicado ao folk, a Blue Corn Music.
Com mais dois álbuns de estúdio pela Blue Corn, inclusive uma coleção de faixas ao vivo, a cantora texana mudou-se para Memphis para gravar aquele que seria o registro essencial de sua carreira, The Truth According to Ruthie Foster, disco que acabou rendendo sua sequência de shows mais extensa e culminando com o lançamento do CD/DVD Live at Antone’s.
Chamando cada vez mais a atenção da crítica por sua sonoridade tão pura, Ruthie Foster foi indicada ao Grammy de Melhor Álbum de Blues com o álbum Let It Burn, em 2013. O prêmio não veio, mas o reconhecimento sim. Com respaldo cada vez maior da crítica, a visibilidade da cantora ultrapassava cada vez mais as paredes do pequeno estúdio localizado em Houston e passou a gerar expectativas.
Em 2014 Ruthie lançou seu novo álbum, Promise of a Brand New Day, disco que marca o ponto mais alto de sua paixão pela música americana. Com faixas desenhadas milimetricamente para absorver o que há de melhor do folk, do blues, do soul e da música country. É seguro dizer que a texana finalmente está pronta para um novo momento na carreira, principalmente por ter chego a esse patamar livre das tendências da música moderna e fazendo o que mais gosta.
Promise of a Brand New Day dificilmente frequentará as listas de Melhores do Ano nesse início de 2015. Sem uma divulgação maciça e com uma artista avessa ao mainstream, o chamado “sonho americano” de Ruthie Foster não envolve cifras astronômicas ou reconhecimento de grandes gravadoras. Convidada para abrir algumas apresentações da The Allman Brothers Band, a cantora americana conseguiu chegar onde mais desejava: estar perto de quem ao longo da carreira também se dedicou à música como ela.
Seja pelo blues mais tradicional de Singing The Blues, faixa que abre seu mais novo álbum, a gospel The Ghetto ou a lindíssima Believe, que parece beber cada vez mais da obra de Aretha Franklin, Promise of a Brand New Day não pode passar em branco. Mais do que um disco indicado à fãs de blues ou soul, o novo registro de Ruthie Foster mostra que é possível alçar voos altos na carreira reverenciando de forma sincera a cultura musical do seu país.
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Independente dos resultados alcançados, tanto pela texana como por Dave Grohl em sua missão de reverenciar a música americana, o resgate de algo muito maior que o lançamento de um álbum está em jogo. Reverenciar a história é mantê-la viva e ambos os artistas buscaram isso ao seu modo, mas talvez fique cada vez mais nítido o tamanho da influência que cada gravadora tem seu sobre seu artista, cabendo ao mesmo decidir sempre qual rumo tomar em prol de algo maior, a música.