Em um disco primoroso, Black Crowes faz um dos melhores álbuns de rock lançados nos últimos anos, mas segue à margem do status de salvador. E esse é um rótulo que nenhum dos irmãos Robinson deseja ostentar.
Esqueça as desavenças dos irmãos Cavalera. Esqueça até mesmo as brigas dos irmãos Gallagher. Sério. Poucas coisas no mundo da música podem superar o que foi a crise entre os irmãos Robinson, Chris e Rich, que fizeram com que o Black Crowes implodisse em um dos melhores momentos da carreira. Capazes de dar entrevistas dizendo que nem eram irmãos, Chris e Rich conseguiram fazer as pazes e, por consequência, voltaram com o Black Crowes nos últimos anos. Parecia que ia acontecer de novo, mas aparentemente, a dupla viu que, juntos, são muito melhores não só para eles, mas para o mundo da música. E depois de um ótimo EP de covers, lançou finalmente aquele que deve ser um dos maiores lançamentos de 2024, Happiness Bastards, seu nono e novo trabalho de estúdio.
Com uma discografia sólida até a virada do século, o Crowes poderia ter sido a salvação do rock, mas os irmãos Robinson jamais topariam isso. Fosse lançado em uma época onde o rock ficou dançante om a avalanche de Strokes e similares, Happiness Bastards entraria com os dois pés na porta, tamanha crueza com que é executado. Talvez não seja o objetivo, mas a verdade é que Rich e Chris só sabem fazer isso e, por esse motivo, seu novo trabalho segue potente em uma discografia que pouco oscila.
Claro, como músicos e também como pessoas, ambos evoluíram. A discografia solo com um pé no circuito de jam bands reflete em faixas de seu novo disco um resultado bem interessante, caso de Kindred Friend e Wilted Rose, feitas para um bom domingo à tarde sentado na varanda. No mais, estamos diante de uma combinação furiosa de tudo o que o mais conservador fã de rock espera, mas estranhamente não cria vínculos com o Black Crowes. Riffs potentes, refrães grudentos, backing vocals que engrandecem ainda mais a performance de Chris, que parece hoje viver um momento ainda melhor que seu – louco – auge.
Dito isso, é impossível não se impressionar com a vitalidade de faixas como Rats and Clowns ou Flesh Wound. É rápido, intenso e esbanja criatividade. O Crowes consegue em seu novo álbum usar todos os clichês possíveis, mas sem exaurir nenhuma fórmula. É aquele doce saboroso na medida certa, impossível de enjoar. E sem ultrapassar qualquer limite, o disco acaba sendo ignorado por uma enorme fatia de quem questiona diariamente em fóruns de internet que o rock acabou.
Trata-se de um disco forte, mas que dificilmente irá além da bolha que já abraça o grupo. Vivemos em uma geração de superlativos, de referências que precisam ser cada vez mais óbvias. Dessa forma, não é por acaso que bandas sejam aclamadas como “novo Led Zeppelin”. No caso do Crowes, torna-se impossível pensar em algo recauchutado, são apenas eles, o Black Crowes. E isso é o suficiente.