Lançado pelo Selo SESC, tributo que revisita obra do lendário compositor e violonista apresenta uma constelação de artistas em celebração de seus 90 anos de vida

Desconhecido do grande público, mas essencial na música brasileira, Carlos Lyra merecia algo à sua altura e, sim, teve. Afeto, lançado pelo Selo SESC nesse fim de 2023, apresenta 14 faixas que revisitam sua história através da voz de artistas que, assim como ele, revolucionaram a música popular brasileira. Não é exagero, em Afeto, estamos diante de um dos maiores tributos já lançados por aqui. Afinal, não é todo dia que temos no mesmo álbum artistas como Gilberto Gil, Djavan, Marcos Valle, Caetano Veloso e Monica Salmaso.

Devoto da música brasileira, Carlos Lyra demoliu ao longo dos anos 70 a ideia da bossa-nova somente como um “jazz brasileiro”. Amante do samba, trouxe para sua geração uma capacidade ímpar de criar canções que abraçaram o Rio de Janeiro, o berço do gênero que tanto ama. Por isso, em seu tributo, somente a mão de grandes mestres para louvar seu legado instrumental, como o saudoso João Donato, o virtuoso Jaques Morelenbaum, Antônio Adolfo e Gilson Peranzzetta.

Ainda que seja praticamente impossível enaltecer algum momento ou outro no disco, certamente há destaques que batem mais forte em Afeto. Edu Lobo, com Minha Namorada, e Gil com Saudade fez um Samba, assustam pela beleza com que são executadas. Definitivamente, não é só um tributo, mas um desfile pelo mais fino que a música brasileira pode oferecer.

Uma das ótimas surpresas é a voz de Fernanda Abreu, em Samba do Carioca. Música que foi composta ao lado de Vinícius de Moraes, a faixa soa moderna nos arranjos de João Donato para a cantora que desde os anos 90 define o Rio de Janeiro como mais ninguém. O momento contrasta com a doce voz de Monica Salmaso, que faz de E Era Copacabana um belíssimo samba-canção. Ela que recentemente fez parte da turnê de Chico Buarque em uma das mais celebradas turnês de 2023.

Entre artistas modernos e aqueles tão clássicos quanto o próprio homenageado, Afeto é uma viagem pela força da música brasileira. De repente, uma faixa cantada por Lulu Santos ou Caetano Veloso servem apenas para unir pontas da história para um grande tributo, mas que não parece tributo até que você entenda que uma única mente foi capaz de fazer tantas composições como as executadas.

O disco segue o padrão de qualidade dos lançamentos do Selo SESC em 2023, mas destoa pela constelação que carrega em seu repertório, até por isso, cumpre bem a missão de apresentar um artista que não goza de tamanha popularidade quanto alguns daqueles que o reverenciam. Hoje com nove décadas de história, Carlos Lyra é, em vida, o sol de uma constelação de estrelas que brilham por sua obra.