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Entrevista SANDÁLIA DE PRATA

15 de julho de 201710 min read

Formado na virada do século, o Sandália de Prata é um verdadeiro patrimônio do samba rock da selva de pedra chamada São Paulo. Com por Ully Costa (Voz), Dado Tristão (Teclados), Ocimar de Paula (Baixo), Everson Gama (Guitarra), Dedéu Soares (Bateria), Tito Amorim (Percussão), João Lenhari (Trompete), Jorginho Neto (Trombone) e Raphael PH (Sax), o grupo comemora atualmente o lançamento do álbum Maloqueiro e Elegante, que ganhou lançamento em vinil pela Tratore Records.

Respaldado por uma gama de artistas do primeiro escalão da música brasileira, o Sandália de Prata segue escrevendo uma história tão verdadeira quanto sua devoção pelas raízes da música brasileira, um processo que vai muito além da música pura e simples.

Vivendo um momento especial na carreira, o grupo conversou com o Passagem de Som em uma entrevista verdadeira, autêntica e apaixonada. Elementos responsáveis por ter tornado o grupo uma referência no samba rock.

A possibilidade de incorporar novas influências ao samba rock
Ully Costa: Essa é uma questão que permeia a vida da gente !!! É complicado, pois temos diversas influências e sonoridades, mas o mercado e o público em geral sempre acaba buscando um rótulo.

Para o Sandália acabou sendo o rótulo do samba rock, que muito nos orgulha, mas acho que o som que fazemos vai mais além de um único estilo. Não temos receio de incorporar novas influências porque encontramos a nossa sonoridade e aprendemos a chegar num resultado que nos satisfaz, a partir do encontro dessas várias influências. A gente nunca pensou numa autodenominação, mas eu diria que o que fazemos é Música Popular Brasileira (assim, por extenso e não a sigla, que também acabou ficando rotulada).

O público de samba rock hoje
Ully Costa: Houve um período de maior abertura para um universo mais abrangente de público, por volta de 2005/2008, quando o estilo atingiu mais visibilidade e outros públicos.

A cultura do samba rock é originalmente periférica e muito ligada à comunidade negra, mas com o tempo isso foi se abrindo e se ampliando. O público do samba rock é, em grande parte, de pessoas ligadas diretamente à esta cultura, que tem a dança do samba rock como seu elemento mais forte. Sim, é um nicho ainda específico, apesar de se ouvir samba rock com frequência na publicidade ou em novelas, por exemplo.

Sentimos um certo preconceito – ou desdém – por parte de uma intelligentsiacultural, tanto de músicos quanto da imprensa. Nada que já não se saiba sobre a relação da classe média com as culturas periféricas (mas quando a Mallu Magalhães apresenta um samba rock aparece um monte de gente que não dá bola para o gênero para elogiar e “sambar” junto).

A possibilidade de fazer música depois de mais de uma década de história
Ully Costa: Não é mais complicado do que sempre foi. Se a gente dependesse da banda para viver, aí sim seria, mas eu e todos os músicos, assim como a produção, seguimos com o projeto em grande parte por amor. A hora que acabar o amor e o tesão pela música, daí acaba tudo.

O risco do samba se tornar “música de turista”
Ully Costa: Não acho que o samba seja e nem corra o risco de ser música para turista. O samba é e sempre será parte importante da alma brasileira.

Acho que é por isso, meio que inconscientemente, que tanto turista gosta de samba! Na verdade o que nos preocupa é como a cultura brasileira vem sendo desprezada, desmontada e desfigurada pelo poder público e pelos meios de comunicação de massa.

Já ouvi relatos de aulas de música para crianças em escolas públicas dos Estados Unidos onde se ensinava sobre John Coltrane, Gershwin e Miles Davis… agora, pergunte hoje a alguma criança da rede pública brasileira se elas já ouviram falar em Pixinguinha, Luiz Gonzaga ou Jackson do Pandeiro.

Bom, sem querer cair em clichês, mas a antropofagia está nas nossas raízes, né? Em especial aqui em SP. Eu mesma sou filha de sertanejos, cresci ao som das modas de viola, mas também ao som do samba e dos forrós que vinham dos quintais de tanta gente preta e nordestina do meu bairro de infância, o Capão Redondo. Lá eu aprendi a curtir o samba e os bailes black. Muitos dos meus companheiros de banda têm histórias semelhantes e outros já trazem elementos de outras vivências, como a bossa e o jazz. Acredito sim que, nesse sentido, a gente busque um caminho na linha evolutiva da música brasileira, como já diria Raul.

Por que o samba rock não está nos grandes festivais?
Ully Costa: Pois é, por quê?

O circuito de samba rock em SP e a estrutura das casas
Ully Costa: Já houve um circuito, reduzido, mas houveram casas como o pioneiro Grazie a Dio, posteriormente o Diquinta e projetos como o Salve Quarta.

Hoje em dia para as bandas é bastante complicado. Não há um circuito de casas e quando surge alguma oportunidade as condições de trabalho não são as mais fáceis. Além disso, é uma cultura muito baseada na dança e você pode muito bem dançar com os ótimos DJs do gênero que há em SP.

Sendo assim, o esforço que as bandas têm que fazer para mostra o seu trabalho é dobrado. Claro que isso não inclui alguns oásis, como o Sesc e eventualmente a Virada Cultural.

A relação da turbulência social com a música
Ully Costa: Isso é algo que me incomoda pessoalmente. Acho que não somos uma cena (se é que existe uma cena) muito engajada político e socialmente. Em muitos casos me parece que é o tipo de som mais voltado para o entretenimento, a diversão e a sensualidade, o que acho ótimo, mas ultimamente temos buscado outras inspirações e pensado em como usar nossa voz para um discurso mais combativo.

As possibilidades de lançamento e o Sandália de Prata
Ully Costa: Pois é… lançamos inicialmente o CD com show no Sesc Pompeia, casa cheia, como manda o figurino. Algum tempo depois lançamos nas plataformas digitais e usamos as redes sociais para promover esse lançamento e agora faremos o show de lançamento do LP, que é sempre o nosso maior xodó.

Temos todos os nossos álbuns lançados em LP. Bom, é sempre uma boa ter mais motivos para celebrar, né?!

A devoção da classe artística e a relação com o sucesso
Ully Costa: Isso é, ao mesmo tempo, motivo de orgulho e alegria, mas também de uma certa tristeza e curiosidade. Me explico: às vezes me pego pensando nos motivos de um som que é elogiado e admirado por Elza Soares, Simoninha, KL Jay, o saudoso Jair Rodrigues, Ellen Oléria, Max de Castro, entre tantos outros, é muitas vezes desprezado por grande parte da mídia, incluindo aí as rádios, veículo ainda tão importante para o acesso à música no Brasil.

Isso se reflete no público, quero dizer, muita gente acaba não conhecendo o som da banda porque aqueles que poderiam amplificar a nossa música não o fazem.

Bom, o que sei é que estamos aí, tocando, compondo, gravando e seguindo na estrada com novos planos, inclusive de novas parcerias.

Daqui por diante
Ully Costa: Muito respeito à música, aos compositores e ao público que nos acompanha e certeza de novos projetos para 2017/2018.

Anderson Oliveira

Diretor de Arte há duas décadas, fã de Grateful Dead e Jeff Beck, futuro trompetista e em constante aprendizado. Bem-vindos ao meu mundo, o Mundo de Andy.

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