Em álbum inspirado na cidade de São Paulo, grupo mostra que fazer música pode ser simples como andar de metrô na Linha Verde ou tão complexo quanto fazer baldeação na Linha Amarela com a CPTM. Fruto da nova geração da vanguarda paulista, a Filarmônica de Pasárgada completa uma década de seu primeiro álbum divulgando PSSP, proporcionando uma viagem pela São Paulo que só quem vive dentro dela entende.
Com um roteiro que lembra bem a primeira geração da Vanguarda Paulista, movimento que ganhou força no fim dos anos 70 e meados dos anos 80, a Filarmônica de Pasárgada (sim, da referência do poema de Manuel Bandeira) também nasceu da amizade de seus membros no curso de música na USP.
E do amor pela música, nasceu a capacidade de fazer dela algo que desafia a lógica de tudo, especialmente dos algoritmos e do pop. São andamentos complexos, mas com palavras simples. Talvez você não consiga cantá-las como os integrantes da banda, mas vai adorar ouvir cada uma das faixas para saber qual a próxima rua em que ela vai virar.
Em ritmo de crônica, a Filarmônica de Pasárgada adentra 2023 com PSSP, uma declaração de amor ácida à cidade de São Paulo, que completou 469 anos com uma pluralidade que é bem explorada no repertório de 14 músicas.
No disco, o luxo e o lixo, o cult e o brega, o caos e o silêncio, a periferia e o centro. Assim como nomes que inevitavelmente buscamos na memória, como Premê ou Arrigo Barnabé (lembrados na faixa Lira Paulistana, famosa casa onde a Vanguarda Paulista se apresentava), o que é visto no disco é uma música que cumpre seu propósito desde o início, pintando na nossa imaginação paisagens da cidade em meio uma diversidade musical.
Permeado por uma atmosfera lúdica, PSSP tem de tudo, inclusive nada. Afinal, quem seria capaz de inserir minutos do mais puro silêncio em um disco, como na faixa Psiu? Mas nos pouco mais de 40 minutos de disco, fique tranquilo, há ruídos, referências intermináveis e ritmos que vão do forró ao rock. Eventos são lembrados, como na engraçadíssima Virada Cultural, que ainda fala de diversos eventos que se somaram ao vasto calendário da cidade, além suas principais vias e problemas.
Esbanjando temais atuais, o novo trabalho da Filarmônica de Pasárgada analisa não só os espaços da cidade que o abriga, mas o comportamento de seus moradores, o que torna esse mergulho ainda mais interessante, claro, para quem já se acostumou com uma música que nem de longe tem o objetivo de tocar no rádio. Imagine Frank Zappa encontrando Tom Zé. Ou o Quarteto de Cordas de São Paulo encontrando Andreas Kisser (ops, isso realmente aconteceu em 2022). É daí que a premissa musical do grupo dá forma a outro belo disco de sua discografia.
Fruto de uma geração que não teve medo de ousar, o grupo paulista segue esbanjando coragem ao trabalhar numa música que não tem limites. É tudo isso esbanjando alegria, talvez a marca mais forte daquela primeira geração, que taxada como cerebral, produzia um conteúdo capaz de fazer o que qualquer artista busca fazer com o público, que é deixá-lo feliz. Se sentir feliz. Em PSSP, mesmo no minimalismo e no intimismo, está ali a ironia de quem sabe que no caos de São Paulo está também a beleza de um lugar que soube abraçar a todos.