Em Shangri-lá, álbum de estreia de projeto formado por experientes músicos da cena gaúcha dá aula com simplicidade, impressiona pela riqueza instrumental e proporciona uma verdadeira viagem musical não só pela cultura do Rio Grande do Sul, mas pela música que precisamos redescobrir.
Talvez seja na primeira, na segunda ou na terceira audição. Apenas tenha a certeza. Em algum momento alguma das faixas do álbum de estreia do Graxelos vai conectar tudo o que precisamos aprender sobre música. Aprender não, reaprender. Disco de estreia do grupo que tem em seu line up experientes nomes da música gaúcha, o projeto coloca lado a lado a capacidade de fazer com que composição, melodia e leveza caminhem lado a lado com rara beleza.
Mais que se autoexaltar ou exaltar a cultura que o cerca, o disco propõe uma viagem. Não exatamente pela Shangri-lá da criação literária do inglês James Hilton, de Horizonte Perdido, lançado em 1933. Ao invés do Himalaia, a viagem é pelas estradas do estado gaúcho, tão próximo de nós. E o encanto é o mesmo. Ao melhor estilo Crosby Stills & Nash, nosso Marrakesh Express passa agora passa por Vacaria, Santa Maria e Porto Alegre, como canta Gustavo Telles (ex-Pata de Elefante) em O Viajante.
Com músicos de enorme know-how, não só musical, afinal, basta meia hora de Google para saber o tamanho da dedicação de seus integrantes pela música que produzem, completam o grupo Murilo Moura (piano, teclados e vozes de apoio), Vini Brum (voz, baixo, violão e voz de apoio) e Vítor César (voz, guitarra e voz de apoio). A banda trabalha com um letrista, Márcio Grings (que também toca harmônica no álbum), parceiro de Telles em todas as canções. Dito isso, aperte os cintos porque a viagem apenas começa.
Em seu disco, o Graxelos traz de volta para nós a experiência de um processo completo. De embarque, de viver a viagem enquanto ela acontece. Em Naipe de Metais, Gustavo dá a letra de processo “Não interessa o que somos / E o mundo o mundo fala sobre nós / É o fim da festa meu amor / Acabou, mas a música não parou”. E com essa filosofia, tudo o grupo abusa de melodias que poderiam durar horas, mas que dificilmente ultrapassam 5 minutos. Em Shangri-lá, a ideia de muita informação se mostra com tamanha simplicidade e reforça como a música popular é tão rica. Nós é que deixamos de perceber isso.
Permeado por grandes momentos, o disco de estreia do Graxelos evita uma monotonia que faz com que a viagem, de dez músicas, se mostre muito maior. Essas paisagens sonoras ganham ainda mais forma através das belas Água Límpida e Copos de Plástico, além da faixa-título do disco, alguns dos seus melhores momentos. Tudo é autoconfessional, mas parece que ao longo de suas faixas, Gustavo canta a viagem que gostaríamos de ter vivido. Com cara de tarde de sol, Shangri-lá tem cara de trilha sonora de um filme nunca feito, mas que todos imaginamos as suas cenas.
A reta final dessa viagem, com Desde que perdi a minha fé, coloca ponto final nesse trem. É como se cada uma das 10 faixas mostrasse ao seu ouvinte um ponto de vista, mas mais que isso, uma nova forma de se fazer música, fugindo da repetição, mas sem se distanciar do que já sabemos que funciona conosco. Assim, tudo soa fácil. Em Shangri-lá, o Graxelos mostra muito sem parecer exagerado. E o fim soa com cara de chegada.
Com previsão de lançamento físico, em CD e LP, até o fim de 2024, seria realmente uma pena se o álbum ficasse disponível somente nas plataformas digitais. Tal qual uma viagem perfeita, todos queremos uma boa lembrança nas nossas mãos.