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Marilyn Manson: os 20 anos de Mechanical Animals

29 de fevereiro de 20209 min read

Quem viveu a década de 90 não esquece. No auge de bandas que moldaram a música pesada como Slayer e Anthrax havia Marilyn Manson. Figura escatológica que assombrou a “família de bem” nos quatro cantos do mundo questionando a existência de Deus e deturpando qualquer sentido de gênero ao longo de seus dois primeiros álbuns, respectivamente Portrait of American Family (1994) e Antichrist Superstar (1996), discos produzidos por nada menos que Trent Reznor, a mente por trás do Nine Inch Nails.

Mesmo não sendo visualmente tão ligado ao público mais extremo de heavy metal, Marilyn Manson sempre agradou a toda essa cena especialmente por seu comportamento, representado por uma atitude questionadora e desafiadora em letras e performances. Essa ousadia, claro, faria com que uma gama notável de protestos acontecessem por onde suas turnês passassem, inclusive no Brasil.

Para a construção de sua imagem, o norte-americano tinha planos ambiciosos como “abalar as estruturas do cristianismo” e despir a sociedade americana de todos os dogmas que pareciam mantê-la em harmonia. Disposto a tal propósito, lançou Portrait of American Family inspirado em sua própria história, escancarando o fascínio de americanos por armas e uma psicopatia travestida em lares até então “normais”. Depois investiu em uma temática profunda e questionadora, explorando a filosofia do super-homem de Nietzsche, construindo um álbum conceitual apoiado em três pilares. Eram eles “O Hierofante”, “A Inauguração do Verme” e “A ascensão do Desintegrador”, cada um contando uma fase de sua vida dentro da sociedade americana. E com Antichrist Superstar se tornaria o artista tão temido dentro do mundo da música.

Pouco se falava na época sobre essa questão tão reflexiva adotada por Marilyn Manson. Bastava apenas dizer seu nome para que reações das mais adversas fossem colocadas à mesa em qualquer canto do planeta. Mesmo com videoclipes lançados ao longo de seus dois discos, faltava dar forma ao monstro tão imaginado pela sociedade americana, e isso aconteceria com Mechanical Animals.

De fato Mechanical Animals foi também o álbum mais ousado da carreira do vocalista. Apostando em uma estética ausente de gênero, futurista e escatológica, Manson se tornou a “galinha dos ovos de ouro” da MTV logo em seu primeiro single, The Dope Show, que é até hoje um dos mais importantes da história da emissora. 

Diferente da profundidade filosófica de Antichrist Superstar, o terceiro trabalho de inéditas de Manson falava especialmente sobre a relação das drogas com a sociedade americana e suas consequências. Letras como a própria The Dope Show, com seu refrão “Nós seremos estrelas nesse Show de Drogas” e I Don’t Like the Drugs (But the Drugs Like Me) e sua sugestiva frase “Eu não gosto das drogas, mas as drogas gostam de mim” são um bom exemplo disso. Quase em tom de socorro, Coma White lidava com o vício não só em drogas ilícitas, mas em uma condição de fuga da realidade, a facilidade de acesso a remédios e suas consequências, como o próprio Manson poderia conferir meses depois do lançamento.

Mesmo com uma polêmica menor, o sucesso de Mechanical Animals foi instantâneo. De banda em ascensão da cena alternativa, Marilyn Manson se tornou o sujeito assustador e que levou seu terceiro disco ao primeiro lugar em vários países. E embora não tão pesado quanto Antichist Superstar e com uma dose de experimentalismo muito mais notável, trouxe faixas mais pesadas como Posthuman, que nada deviam a qualquer banda de trash metal como Metallica e Slayer. Tudo isso aliado a elementos eletrônicos que faziam de Manson o grande nome do chamado metal industrial.

Já em 1999, aproximadamente seis meses após seu lançamento, o universo de Marilyn Manson teria um baque após a associação injusta da mídia do nome do músico com o terrível Massacre de Columbine, quando Dylan Klebold e Eric Harris mataram 12 alunos e um professor naquele que seria o primeiro e emblemático caso de massacres promovidos nos Estados Unidos.

Fãs de Marilyn Manson, Dylan e Eric foram considerados influenciados pelo trabalho realizado pelo artista americano, que seria demonizado aos quatro cantos e deturpando completamente sua obra. Ainda que da forma que não gostaria, Manson se tornaria o monstro tão temido pela sociedade americana. Mesmo com a polêmica, o disco se tornaria responsável por inserir o vocalista como uma das grandes personalidades americanas, onde poderia ao longo do tempo mostrar que seu trabalho nem de longe seria o gatilho de um problema tão sério. O que se comprovou nos anos seguintes.

Quem assiste ao documentário de Michael Moore, Tiros em Columbine, se surpreende com a serenidade com que Manson trata a situação, logo percebendo que o problema de tudo era fruto da sociedade que ele sempre apontou o dedo em seus discos.

Dali por diante a máxima um dia adotada por Alice Cooper, de que “nada mais chocava a sociedade que as matérias da CNN”, se tornaria verdade. Manson nunca mais foi o mesmo.

O fim do relacionamento com Dita von Teese anos depois, o rompimento com o guitarrista Twiggy Ramirez (que posteriormente voltaria a trabalhar com Manson) e a depressão foram alguns dos ingredientes que tiraram do artista americano sua capacidade de chocar o mundo diante de um olhar único. Além disso seus álbuns oscilassem sem chamar tanta atenção da grande mídia. Com exceção de polêmicas voltadas a integrantes de outras bandas, nada chamava mais a atenção para Manson como nos anos 90.

Atualmente em turnê de Heaven Upside Down, provavelmente seu disco mais elogiado desde a virada do século, Marilyn Manson ainda se ampara em um passado e é destaque em qualquer line up, sempre oscilando entre o papel de protagonista e coadjuvante para as mais variadas audiências.

Não há como negar a importância de Marilyn Manson, tanto musicalmente como socialmente, assim como sua importância dentro da música pesada. Dono de um espectro praticamente sinestésico, o músico americano parece sucumbir a uma realidade cada vez mais tão assustadora quanto sua música e mostrando que – ao menos nos anos 90 – estava muito a frente de seu tempo ao identificar os problemas de toda sociedade americana.

Anderson Oliveira

Diretor de Arte há duas décadas, fã de Grateful Dead e Jeff Beck, futuro trompetista e em constante aprendizado. Bem-vindos ao meu mundo, o Mundo de Andy.

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