Em sua segunda temporada no Brasil, festival de origem canadense sobe o sarrafo em seu line up, se consolida como referência em seu formato e abre as portas para uma nova tendência no país: as festas eletrônicas para a família.
Normalmente realizadas em espaços distantes da capital – ou até dentro dela, mas em cenários improváveis – festas que têm como mote a música eletrônica sempre tiveram uma associação problemática no Brasil, em especial no que tange a relação entre seus frequentadores a um comportamento repleto de excessos.
Ainda que isso tenha mudado nesses últimos anos, existe uma atmosfera que sempre perdurou em eventos associados às raves, que é a impossibilidade de pensar nas mesmas como um evento familiar, em especial pela sua duração, normalmente atravessando a noite, e a entrada de menores de idade.
Essa imagem começou a mudar há poucos meses, quando o festival canadense Piknic Électronik resolveu fincar sua bandeira em São Paulo e fazer o impensável: reunir grandes DJs aliado a um espaço família com horário passível de participação do público até o seu encerramento, às 22h-23h, em uma estrutura que envolve até mesmo atividades voltadas às crianças. Tudo isso ao som de alguns dos mais representativos DJs do mundo.
Realizado no Canadá há mais de uma década, o Piknic Électronik teve início conturbado no Brasil, exatamente pelo desconhecimento de seu formato. De volume e BPM (batidas por minuto) inferior ao convencional, o evento foi confundido com uma rave tradicional e suspenso do Jardim Botânico, onde festivais já eram realizados. Migrou para o Parque do Ibirapuera, onde resistiu às polêmicas e fez sua primeira edição com público aproximado de 3 mil pessoas. Na estrutura, além de nomes como Jasper James e Acid Pauli, experiências de arte, sustentabilidade e gastronomia, mas em especial um ingrediente diferenciado, o Petit Piknic, primeiro espaço projetado para crianças dentro de um festival de música eletrônica. O resultado foi surpreendente e basta alguns minutos nas redes sociais do festival para comprovar o cuidado.
Com edições respaldadas pelo alto nível de seu line up e uma estrutura familiar, o festival canadense iniciou em outubro uma segunda etapa, apostando na receita que segue cativando o público, combinando elementos totalmente díspares no imaginário de quem pensa em festas eletrônicas. Headliners de alguns dos maiores festivais do mundo, o WHOMADEWHO deu o pontapé inicial na série de eventos, que encontrou também sua primeira adversidade em São Paulo, com o louco clima da cidade a as intensas chuvas que vem pegando produtores de calça curta. Daqui por diante, mais um elemento de preocupação para a organização.
Sua última edição em 2023 já tem data, dia 2 de dezembro, e tem nomes de encher os olhos. Ryan Elliott e DJ Tennis prometem manter o sarrafo do festival em alto nível para encerrar um ano que começou sob desconfiança, mas se encerra abrindo caminho para novos eventos do tipo, como o europeu Brunch Electronik, que vem ocupando o Parque Villa Lobos, na zona oeste da cidade. Essa concorrência abre mais uma opção nesse tipo de festival. No fim das contas, quem ganha é o público, especialmente aquele com crianças pequenas e que nunca deixou de lado as pistas de dança.
Pioneiro nesse formato por aqui, o Piknic Électronik abre uma porta que parecia fechada na cena eletrônica. Antes fadada a excessos (e, obviamente, independente dos espaços, eles sempre vão existir) e a um público mais jovem, o conceito de um ambiente familiar torna a realização de eventos como esse uma chance de garantir a integridade de uma cena que se tornou popular pelo mundo, mas que parecia condenada a se fixar na noite.
E para quem tem um pouco mais de idade, voltar para casa depois de dançar por horas e dormir antes da meia-noite é, acima de tudo, a garantia de manter as costas menos doloridas em pleno domingo, afinal, na segunda o mundo volta ao normal.