Existem parcerias que nascem para dar certo, assim como a fome com a vontade de comer. Assim pode ser definida a dobradinha realizada pela dupla Raw Poetic, formada pelo MC Raw Poetic (Jason Moore) e o produtor K-Murdock (Kyle Murdock), com Damu the Fudgemunk, que faz parte do Y Society e Panacea, mas que conhecemos de forma mais óbvia através da parceria com Damon Albarn, no Gorillaz.
Depois de Ocean Bridges (2020), disco que sacudiu o universo do hip hop ao celebrar a parceria ao lado do lendário Archie Shepp, a ótima fórmula se repete em Away Back In, dessa vez sem o jazzista.
No ano em que se celebra três décadas da pedra de Rosetta da fusão em estúdio entre o jazz e o hip hop, o Vol. 1 da série Jazzmatazz, de Guru, o gênero nunca foi tão orgânico. Dito isso, o álbum Away Back In é a consolidação de um experimentalismo que fez com que outras vertentes fossem abraçadas pelas rimas e dessem forma a um trabalho que rompe a barreira do que um dia foi considerado artificial por diversas bandas. Assim como um dia disse Nile Rodgers sobre o fatídico episódio em que um sample de Good Times foi “roubado” e estourasse nas mãos do Sugarhill Gang.
Away Back In é repleto de guitarras, se envereda pelo soul e pelo trip-hop, mas é especialmente hip-hop. Mesmo com toda essa gama de elementos, o disco não perde a sua essência inicial. Agora sem o jazz, o disco explora camadas que o tiram de qualquer prateleira. Faixas como Sometime After Midnight, uma ironia com a expressão Jazz After Midnight (daí a origem da expressão JAM), é uma verdadeira viagem que não necessita de solos longos para se perder no horizonte.
Para fãs de Massive Attack, o novo trabalho da dupla Raw Poetic e Damu the Fudgemunk soa como se os ingleses estivessem com uma banda em estúdio. A partir dessa referência, se torna mais fácil a audição de faixas que em alguns momentos soam distantes até mesmo do hip-hop. The Speed of Power, não fossem as rimas e sua forma de execução, poderia facilmente ser uma faixa neo-soul de John Legend ou Frank Ocean. A atmosfera é a mesma. Essa sonoridade ajuda também a explicar o que premiações como o Grammy usa como “Urban” em suas premiações.
Disco que figurará com facilidade entre os grandes lançamentos de 2023, Away Back In, como o próprio nome diz, é uma volta, a volta de algo que deu certo. E a música agradece a parceria.