Atração da segunda edição do Festival Não Existe, que tem curadoria (e bota curadoria nisso) do quarteto que dá forma à Gop Tun, o holandês Legowelt vem ao Brasil como um dos principais nomes de um festival que prima pela autenticidade, sua marca registrada ao longo de mais de três décadas de história.
Caótico, inquieto, hipnótico, intenso. Essas são só algumas formas de definir a obra de Danny Wolfers, conhecido pela alcunha de Legowelt. Um holandês que, no auge dos anos 90, preferiu seguir uma trilha bem diferente daquela que o mundo acompanhou com a esquadra que dominou a virada do século através de nomes como Tiesto, Armin van Buuren e Paul van Dyk. Esqueça isso, quando falamos de Legowelt, rótulos não cabem em sua música. Ou talvez caibam todos, dependendo do ponto de vista.
Com influências que vão transitam por vertentes como a Chicago House, o electro e o hip-hop, o produtor holandês é uma espécie de Tom Zé ou Hermeto Pascoal da música eletrônica. Devoto absoluto de hardwares, pode ser considerado um verdadeiro Mestre dos Brinquedos, capaz de transformar tudo o que usa para produzir em uma fusão de gêneros capaz de hipnotizar e fazer dançar.
Seus primeiros trabalhos aconteceram ao lado do Unit Moebius, em meados dos anos 90, em um projeto que era definido como um “dream team de música interplanetária”. Se aproximou de grandes nomes da Chicago House, como o visionário Farley “Jackmaster” Funk, e o Underground Resistance, pilar do techno de Detroit. Nessa busca por uma identidade, a IDM (sigla de Intelligent Dance Music) de Aphex Twin e µ-ziq era o passo que faltava para seu pulo do gato.
Lançado em 2002, o álbum Disco Rout nasceu na esteira da ascensão da cena electro de NY, mas trazia muito mais que isso. Nesse caldeirão de influências, a fixação por hardwares. Não é por acaso que seus sets se transformariam em verdadeiras tempestades. Do rótulo pejorativo que hoje acompanha a cena eletrônica de “apertador de botões”, Legowelt sempre teve em seu setup centenas deles, além de teclados, sintetizadores e tudo o que for possível para construir camadas que se sobrepõem e fazem de suas apresentações uma experiência muito peculiar.
Da ascensão à consolidação, um longo caminho e muitos equipamentos surgiram na vida de Danny Wolfers, por isso, a alcunha de Tom Zé da música eletrônica não é à toa. Afinal, como produzir sons que só existem na sua cabeça? Ao longo da década, foram diversas parcerias realizadas com grandes marcas como a Roland e a Novation para formar – e deformar – equipamentos pré-existentes, assim como uma busca incessante por sintetizadores mais obscuros que se perderam na história.
Na última década, Legowelt, ao melhor estilo Hermeto, resolveu liberar diversos pacotes de samples produzidos em seus estúdios para outros artistas. Também passou a se aventurar nas artes plásticas, um bom reflexo da sua sonoridade. Vale a pena conferir o álbum Unfolding the Future with Amateur Space Jazz, que tem capa desenhada pelo próprio.
Nos últimos anos, Danny Wolfers vem se mantendo ativo com diversos projetos. Alçado a um panteão onde poucos artistas conseguiram com a música eletrônica, viaja o mundo enquanto segue produzindo pinturas e colhe os frutos de outro imenso projeto onde assumiu todas as pontas. Trata-se de Ambient Trip Commander, uma animação que reflete bem o que se passa em sua cabeça e pode ser assistida abaixo. Por si só, a obra merece uma resenha isolada, não dá para deixar passar.
É com essa bagagem que o artista holandês, hoje a autêntica vanguarda da arte contemporânea, vem ao Brasil. Esperar o imprevisível se torna fundamental. Por isso, mais que um DJ, estaremos diante de alguém que vê o mundo como as quatro palavras que abrem esse texto: caótico, inquieto, hipnótico, intenso. É dançar ou trancar as portas de casa. Legowelt vem aí!