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Um disco amaldiçoado pelo tempo

6 de outubro de 20168 min read

Clássico do horror moderno,  o filme O Exorcista nunca foi só uma simples obra cinematográfica que marcou época com a história de Regan MacNeil, personagem vivida pela atriz Linda Blair. Conta a história que a primeira edição do filme, lançada em 1973, nasceu carregada de maldições que tornaram o filme um clássico do gênero. A maioria delas envolvendo acidentes e até a morte de integrantes da equipe e parentes próximos de seus protagonistas.

Lançado em 1994, o primeiro álbum da banda norueguesa Mayhem, se tornou uma espécie de “O Exorcista” no mundo da música pela quantidade de elementos que tornam seu lançamento um dos mais bizarros da história, ainda que seu alcance se limite somente aos mais aficionados de uma vertente musical que fincou bandeira no underground.

 A história de De Mysteriis Dom Sathanas começa muito antes de seu lançamento, ainda na década de 80. Influenciados diretamente pelos ingleses do Venom. A banda norueguesa escolheu seu nome inspirada pela faixa Mayhem With Mercy, extraída do álbum Welcome to Hell (1981), dos ingleses. Some a isso os ideais pagãos da cultura nórdica e logo o Mayhem ganharia forma e ideais muito bem definidos.

Amparado pelo respaldo do segmentado público com o lançamento de seu primeiro EP, Deathcrush, o Mayhem contava com um quinteto formado pelo vocalista  Maniac (Sven Erik Kristiansen), o guitarrista Euronymous (Øystein Aarseth), o baixista Necrobutcher (Jørn Stubberud), o baterista Manheim (Kjetil Manheim) e Messiah (Eirik Nordheim) nos vocais adicionais.

Ainda sob influência de lançamentos de bandas como Venom e Possessed, a sonoridade do grupo escandinavo se assemelhava muito mais ao death metal tradicional e não ao caminho mais extremo, que o consagrou posteriormente. Aliás, extremas se tornariam as ideias do grupo, que após diversas mudanças em sua formação recrutou o baixista Count Grishnackh, ou simplesmente Varg Vikernes, um dos nomes mais marcantes da cultura metálica.

Ao lado de Jan Axel Blomberg, o lendário baterista conhecido como Hellhammer, o guitarrista Blackthorn e o vocalista e letrista Per Yngve Ohlin, o Dead, a banda passou a escrever as letras de seu primeiro álbum, quando as maldições de De Mysteriis Dom Sathanas recaíram sobre a banda.

Conhecidos por uma parcela do público muito graças à fama de Varg Vikernes em queimar igrejas cristãs na Noruega, o Mayhem já colecionava histórias que fizeram de seu nome sinônimo de algo assustador, tal qual o título do disco, que significa algo como “O Ritual Misterioso do Senhor Satanás”.

Moradores de uma floresta próxima à cidade de Bergen, na Noruega, Dead e Euronymous desenvolveram uma amizade que culminou em um dos acontecimento mais bizarros da história da música, quando o vocalista, literalmente, se suicidou em 1991.

A cereja do bolo aconteceu quando o guitarrista encontrou o corpo do amigo ao lado de uma espingarda e com os pulsos cortados. Ao lado um bilhete onde dizia “Desculpe pelo sangue”, ao invés de lamentar o ocorrido e chamar as autoridades, Euronymous foi até o centro da cidade, comprou uma câmera e registrou a cena, que posteriormente se tornaria uma capa de bootleg do Mayhem, assim como parte do crânio de Dead um amuleto do guitarrista.

O suicídio de Dead levou Attila Csihar aos vocais da banda, que deu sequência às gravações em meio as crescentes tensões entre Varg Vikernes e Euronymous. Com desentendimentos cada vez mais constantes e a uma atmosfera cada vez mais destrutiva, logo os membros da banda pareciam viver em uma guerra silenciosa onde a neurose de Varg acusava o guitarrista de tramar seu sequestro para tortura em uma floresta.

O acerto de contas aconteceu em 1993. Mesmo com boa parte do repertório do disco praticamente gravado, o clima tenso resultou em uma briga entre os integrantes em Oslo, capital da Noruega, resultando na morte do guitarrista. O baixista foi preso e condenado sumariamente a 21 anos de prisão por assassinato em primeiro grau.

Poderia ser o fim do Mayhem, mas a enormidade de elementos que envolvem seu lançamento ainda passava longe dessa possibilidade. Mesmo com os sequentes pedidos da família de Euronymous para retirar do disco as bases feitas por Varg, Hellhammer achou justo ter no mesmo disco assassino e vítima, dando veracidade ao som da banda.

No julgamento de Varg, a descoberta de que tanto ele como o guitarrista planejavam explodir a Nidaros Cathedral, mais importante catedral da Noruega e que aparece estilizada na capa de De Mysteriis Dom Sathanas, para coincidir com o lançamento do disco foi o ponto alto de um circo de bizarrices que fizeram do disco um marco no gênero.

E mesmo cercado de tantas bizarrices, musicalmente De Mysteriis Dom Sathanas também é um marco para o gênero. A velocidade dos riffs, as letras sombrias de Dead e os riffs de Euronymous se tornariam referência para o gênero, que até hoje é considerado um dos mais importantes do gênero.

E nunca mais o black metal foi visto da mesma forma após o lançamento do disco, em 1994. Elevado ao status de cult, De Mysteriis Dom Sathanas  transformou as formações vindouras do Mayhem em uma espécie de bastião dos ideias black metal.

Mais de duas décadas após seu lançamento, o grupo escandinavo segue tocando sua íntegra mundo afora enquanto se resguarda na condição de um dos principais nomes do black metal. Da formação clássica o vocalista Attila e o baterista Hellhammer seguem na banda, assim como Necrobutcher, que assumiu o baixo após a prisão de Varg.

Verdadeiro “Exorcista” da música, De Mysteriis Dom Sathanas segue assustando por onde passa, seja pela quantidade de histórias que o cerca como pelo fato de ser um divisor de águas musicalmente no black metal.

Anderson Oliveira

Diretor de Arte há duas décadas, fã de Grateful Dead e Jeff Beck, futuro trompetista e em constante aprendizado. Bem-vindos ao meu mundo, o Mundo de Andy.

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